Sementes de cana?

Categoria: Geral | Publicado: quinta-feira, janeiro 7, 2016 as 05:01 | Voltar

Em dois anos, agricultores poderão formar canaviais com o uso de pequenas cápsulas contendo de três a cinco gemas cada

As "sementes" da Syngenta

Usar sementes para facilitar o plantio da cana-de-açúcar, uma secular aspiração dos canavieiros, pode se tornar realidade no Brasil em 2017 com a substituição do sistema tradicional de plantio com colmos (pedaços da própria cana) ou mudas por pequenas cápsulas contendo excertos de gemas. É como se fosse uma semente de cana produzida em laboratório. Uma das vantagens mais óbvias da nova tecnologia é a grande redução no volume de material a ser movimentado nas áreas de formação dos canaviais. Há expectativa também de que o novo produto forneça taxas mais elevadas de multiplicação e maior produtividade, além da redução de custo.

A novidade está sendo anunciada pela Syngenta. As ‘sementes’, produzidas em ambiente controlado, estão em fase de adaptação às condições dos campos brasileiros nas principais regiões produtoras do Sudeste e do Centro-Oeste. “O lançamento chega ao mercado em 2017 e é fruto de um acordo de licenciamento exclusivo com a canadense New Energy Farms para acesso à tecnologia CEEDS, que permitirá a produção do Plene Emerald em escala comercial”, informou Daniel Bachner, diretor de Cana-de-Açúcar e Novas Soluções Latino-América da Syngenta. Ainda segundo ele, a tecnologia é complementar aos já disponíveis Plene Evolve (meristema) e Plene PB (pré-brotada), mudas para geração de viveiros e preenchimento de falhas, respectivamente, que oferecem material genético puro. “A nova oferta de Plene é baseada em um tecido encapsulado da planta, que fornece uma taxa de multiplicação mais elevada e um menor custo por tonelada em comparação com sistemas de plantio convencional. É o sonho de todo produtor de cana, plantar como se planta soja ou milho.”

Para se ter uma ideia da diferença de volume, no sistema convencional mecanizado são usadas 20 toneladas de mudas por hectare e, no sistema desenvolvido pela Syngenta, apenas 150 quilos de cápsulas. Com isso, o equipamento de plantio pode ser menor e mais leve, reduzindo o impacto sobre o solo, como explica Bachner. O menor volume também permitirá o uso de tratores menos potentes e o aumento no número de linhas, resultando num ganho de velocidade e eficiência do plantio, segundo ele. “Será possível plantar até 90 hectares por dia com uma máquina.” A tecnologia vai dispensar a formação de áreas de viveiro nos canaviais. Essa parcela do terreno poderá ser destinada ao plantio comercial, aumentando a produção de açúcar, etanol e energia, o que resultaria em melhor rentabilidade para o produtor e para a usina.

O Plene Emerald (esmeralda, referência à cor verde das cápsulas) usa plantas selecionadas, produzidas na biofábrica da Syngenta, em Itápolis, interior paulista. A empresa aperfeiçoou o conceito original de Plene, obtendo vida útil mais longa para a ‘semente’ da cana. “O shelf life (vida útil) do Plene Emerald tem uma performance superior: pode ficar alguns meses armazenado com resfriamento até 12 graus, dando mais flexibilidade tanto à Syngenta quanto ao cliente”, disse Bachner. Segundo ele, estão sendo utilizadas para a produção do material as variedades de cana mais produtivas do mercado. “Em nossas comunicações sobre o Plene Emerald, temos afirmado aos produtores que a nova tecnologia do produto vai trazer uma mudança, não apenas no plantio, mas também no processo de comercialização e exportação. O conceito do Plene Emeradl faz com que haja ganhos de produtividade”, informou o executivo.

Inovações

De acordo com a Syngenta, a nova forma de plantio gera benefícios diretos para o meio ambiente, na medida em que reduz o porte de veículos e máquinas nas operações de plantio, diminuindo também as emissões dos motores a diesel e a compactação de solo. “O lançamento irá contribuir diretamente para o The Good Grouth Plan, o Plano de Agricultura Sustentável da Syngenta, que visa aumentar em 20%, até 2020, a produtividade das principais culturas, sem utilização de mais terras, água e insumos, incluindo a cana-de-açúcar, bem como a preservação do meio-ambiente”, destacou a empresa. O plano é tornar a tecnologia amplamente disponível, com a abertura de novas biofábricas no país. Existe também um modelo de maquinário mapeado que estará disponível para os plantios comerciais em 2017, mas a empresa ainda não definiu os preços das ‘sementes’ de cana. Embora não tenha apresentado números sobre a disponibilidade futura do produto, a Syngenta informou estar certa de que a tecnologia que integra essa nova plataforma vai totalmente ao encontro das demandas que envolvem o segmento.

Os sistemas de plantio da cana-de-açúcar pouco se alteraram desde a chegada do vegetal ao Brasil, por volta de 1530. Tradicionalmente, a multiplicação das plantas é feita através dos colmos cortados com um mínimo de cinco gemas, dispostos em sulcos no terreno previamente preparado. Para introduzir melhorias genéticas e evitar a disseminação de doenças, os produtores de cana passaram a fazer os novos plantios a partir de lotes de plantas cultivadas em viveiros. Uma área da propriedade passou a ser reservada para produzir plantas adequadas ao perfil da usina e que forneceriam os colmos para novos plantios.

Em época mais recente, surgiu o sistema de produção de mudas conhecido como meiosi. Neste sistema, as mudas são formadas no próprio local onde se pretende instalar o canavial, com as linhas intercaladas na lavoura – duas linhas de matrizes são usadas para plantar outras oito linhas. Com isso, evita-se o transporte de uma grande carga de mudas para o local de plantio e não é preciso dispor de terreno para o viveiro.

Nos últimos anos, muitos produtores adotaram a tecnologia da cana pré-brotada, desenvolvida no estado de São Paulo pelo IAC – Instituto Agronômico de Campinas. Os colmos passaram a ser cortados apenas nos pontos em que estão as gemas, desprezando-se a parte inócua para germinação. Os chamados minirrebolos são tratados e colocados em caixas de brotação, em estufas com temperatura e umidade controladas. Quando ocorre a brotação, as mudinhas são passadas para tubetes e levadas para o campo de aclimatação. Ao final de 60 dias, está pronta para ser plantada.

Ainda assim, o sistema exige a formação de viveiros para multiplicação rápida de novos materiais. Já a nova produção da Syngenta ocorre em ambiente de laboratório, dispensando os viveiros, uma vez que as cápsulas contendo as gemas são aplicadas diretamente no solo. Conforme os dados da empresa, para renovar 1,7 milhão de hectares de cana-de-açúcar plantados hoje, seriam necessários 350 mil hectares de viveiros secundários. Como o Plene Emerald não precisa de uma área para formação de viveiros, estes 350 mil hectares poderiam ser usados para ampliar o cultivo ou a estrutura de moagem da cana, proporcionando uma receita de R$ 1,6 bilhão por ano. A empresa não informou quanto a nova tecnologia vai custar para o produtor, mas assegurou que o custo por hectare ficará menor. Atualmente, conforme dados do CTC – Centro de Tecnologia Canavieira, a muda pré-brotada tem preço que varia de R$ 0,50 a R$ 1; a muda meristema de R$ 0,80 a R$ 1 e a muda colmo, de R$ 100 a R$ 180 a tonelada.

Expectativa positiva

O mercado ainda espera mais informações sobre o produto desenvolvido pela Syngenta. Especialistas e pesquisadores acreditam que o uso direto de gemas tratadas das plantas é uma tendência em razão do ganho operacional, além de possibilitar maior controle fitossanitário. Porém, é preciso verificar os resultados da aplicação da tecnologia em plantios comerciais, como as taxas de germinação, o índice de falhas, o desenvolvimento da plantação e a produtividade final. Para Vanderlei Rodrigues Caridade, administrador do viveiro de mudas que a Canaoeste - Associação de Plantadores de Cana do Oeste do Estado de São Paulo e a Copercana - Cooperativa de Plantadores de Cana mantêm no município paulista de Terra Roxa, a tecnologia da 'semente' encapsulada será bem recebida pelo produtor, desde que a custo compatível com o mercado. Ele afirma que os viveiros trabalham com boas técnicas, reconhecidas pelos produtores, mas as novas tecnologias devem ser experimentadas. "Vamos ter de nos adaptar ao uso direto da gema, pois temos de buscar sempre o que é melhor para o produtor. Hoje, levamos a mudinha pronta para o campo, mas dá mesmo um volume muito grande."

* Matéria originalmente publicada na Revista Agro DBO de outubro de 2015 (páginas 28 a 30).

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