Em MS, Mangabeira Unger destaca importância do programa de recuperação de áreas degradadas

Categoria: Geral | Publicado: quinta-feira, julho 9, 2015 as 16:24 | Voltar

Ao expor a estratégia nacional e o papel do Brasil Central, em palestra na capital, o Ministro de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger, classificou com sendo uma revolução a criação da agência de desenvolvimento, que surgiu na reunião que aconteceu em Goiânia, no inicio do mês, pelos governadores dos quatro estados (Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás e Tocantins) e do Distrito Federal e destacou o fomento a atividade agropecuária passando por um amplo programa de recuperação de áreas degradadas como sendo fundamental para a realização da revolução que o Brasil Central precisa promover

Campo Grande (MS) - Ao explicar sua tese, Unger afirmou que o Brasil pode e deve construir uma alternativa nacional de desenvolvimento e que, o Brasil Central e o Mato Grosso do Sul podem atuar na vanguarda dessa estratégia.

Tendo o Governador Reinaldo Azambuja e boa parte de seu secretariado, incluindo Dr. Fernando Mendes Lamas e Jerônimo Alves, secretario e Adjunto da pasta de produção e agricultura familiar do Estado, na primeira fileira, o Ministro começou observando que vimos de um período histórico onde a estratégia de desenvolvimento do País tinha duas bases, uma que foi a massificação do consumo, e o aumento da renda popular, e a outra que foi a produção e exportação de commodities, de produtos primários pouco transformados. Segundo ele, essa estratégia permitiu resgatar milhões de brasileiros da pobreza extrema e manter a grande maioria da força de trabalho empregada, dependendo de muito dinheiro, uma aceleração febril na China e uma alta nos preços das commodities. “Quando essas circunstâncias viraram a estratégia se inviabilizou, ao se inviabilizar revelou uma falha que tinha desde o inicio, que era convivência com um nível muito baixo de produtividade na economia brasileira, o que significa, na pratica, condenar a maioria dos cidadãos a viver vidas pequenas”. Completou.

Para explicar como chegamos a atual situação de queda na economia e restrição fiscal. O Ministro disse ter observado que por algum tempo, o governo, tentou dar sobrevida a esse modelo para atenuar o impacto da crise sobre a situação da maioria trabalhadora recorrendo a politicas contra cíclicas, mas estas também se exauriram e acabaram por perder a sua eficácia.

Sobre o ajuste fiscal e como ele deve ser entendido, Mangabeira classificou-o como uma travessia entre a estratégia antiga e a nova que os Estados têm de construir, tendo como base o produtivismo includente e capacitador, assegurando a primazia dos interesses da produção e do trabalho sobre os interesses do elitismo financeiro.

Para ele, há uma grande diferença entre democratizar a economia do lado da demanda e do lado da oferta. “Enquanto se pode democratizar a economia de demanda só com dinheiro a economia de oferta exige inovação institucional. Inclusive inovação nas instituições que definem uma economia de mercado”.

Para tanto o Ministro destacou duas vertentes, a qualificação do ensino e a democratização das oportunidades produtivas - o produtivismo includente. “Nós tivemos um grande avanço num período histórico recente, no acesso a educação e há muito ainda a fazer. A qualidade da educação no Brasil continua a ser miserável”. Definiu, questionando em seguida o futuro que podemos ter num País onde a população não consegue lidar com o pensamento escrito. “A única coisa que conseguiremos fazer, no futuro, é exportar soja e minério de ferro”. Afirmou justificando ser necessário organizar uma transformação radical do ensino, começando pela mudança do paradigma curricular e pedagógico.

“A nossa educação tradicionalmente é marcada por decoreba e enciclopedismo. É uma imitação de uma variante degenerada do ensino francês do século 19. Como se nosso objetivo fosse transformar jovens brasileiros do século 21 em estudantes franceses do século 19. Temos que organizar outro currículo e uma outra maneira de ensinar e de aprender. Uma maneira de ensinar e de aprender pautada pela aquisição de capacitações analíticas, a começar pelas competências centrais de interpretação de texto e raciocínio logico. Além das competências especificas a cada área do conhecimento”. Completou.

Ao modelo de educação do País, Mangabeira não poupou criticas, classificando-a como sendo a combinação do autoritarismo e do individualismo. “O professor na frente, quantificando e o aluno confinado a sua mesa afundando no isolamento e no tedio”. Segundo ele a educação tem que ser reorganizada com base em praticas cooperativas, aliadas a um conjunto de medidas destinadas a qualificar professores e diretores.

Para o Ministro, a outra grande vertente desse projeto nacional, ao lado da qualificação do ensino básico, é o produtivismo includente, que ele define, resumidamente, como um conjunto de iniciativas destinadas a democratizar as oportunidades econômicas e a dar meios, instrumentos e ocasiões, para o dinamismo produtivo do País.

Ao destacar que há no Brasil uma cultura empreendedora vigorosa, o Ministro alertou que a grande maioria das empresas continua afundada no primitivismo produtivo, justificando que faz falta, no Brasil, uma figura que desempenhe um papel politico nas grandes economias do mundo, que seria a empresa média de vanguarda, que tome frente e organize um desenho institucional, que coordene o acesso ao credito, as tecnologias e práticas avançadas e aos mercados mundiais.

Comentando a importância do produtivismo includente, Mangabeira disse que ele tem a ver com a agricultura e com a agropecuária, afirmando ainda que a agropecuária também pode ser um setor exemplar, basta observar os três objetivos a serem alcançados.

O primeiro dos objetivos destacados pelo Ministro seria a superação do contraste entre agricultura empresarial e familiar, que segundo ele é meramente ideológico. “Não há duas agriculturas. Só há uma agricultura. A agricultura familiar só tem futuro na medida em que ela ganha atributos empresariais”.

O segundo objetivo seria evitar o contraste entre cidade cheia e campo vazio, buscando a diversificação da produção agropecuária e a industrialização de seus produtos.

E o terceiro objetivo seria promover uma serie de inovações em todo País, e não apenas no Sul, onde historicamente existe uma classe media rural forte, com uma linha avançada de uma massa de produtores e trabalhadores agrícolas mais pobres que avança com ela.

Ao destacar a generalidade dos mercados agrícolas, Mangabeira fez duras criticas aos vendedores de insumos e aos compradores dos produtos afirmando que estes formam no Brasil carteis e oligopólios. “Os produtores estão fragmentados, os vendedores e compradores é que ficam com a parte grande dos ganhos da agricultura. É preciso mudar esse quadro promovendo a associação entre produtores e organizar, por meio do poder publico, a comercialização dos seus produtos”. Completou.

Depois de falar da relação entre capital e trabalho. Mangabeira citou uma série de travas, que pesam sobre o impulso produtivo no País, destacando entre elas o que classificou como confusão ambiental, e um pesadelo para os produtores, a falta de regras ambientais no País. “O problema não é que as regras ambientais sejam exigentes demais. O problema é que não há regras ambientais”. Disparou, afirmando que o direito ambiental no Brasil é um pseudo direito, quase integralmente vazio de regras, que delega poderes discricionários a autoridades administrativas, que na falta de regras, viram joguetes, embates entre ideologias e interesses contrastantes.

Ao exemplificar outra trava que onera a produção, o Ministro chamou o regime tributário de colcha de retalhos e desvario. “Uma combinação de casuísmos que gera uma confusão econômica desproporcional a receita que arrecada, distorce os preços relativos, acirra a guerra fiscal na federação e castiga os Estados, grande maioria consumidora de produtos industrializados do Sudeste”.

Para tanto ele sugere a simplificação radical do sistema tributário, caminhando rumo a um imposto universal, abrangente e neutro sobre o valor agregado, com componente Federal e Estadual, combinado com uma tributação progressiva sobre o custo individualizado e talvez, com tributo sobre as exportações, cuja alíquota variaria de maneira inversamente proporcional a agregação de valor, para estimular tributariamente a agregação de valor. “É um grande projeto, é um projeto para libertar as energias produtivas do País, e este projeto só vai ser fecundo se ele for combinado com uma politica macroeconômica adequada que insista na disciplina fiscal e a use para forçar a baixa nos juros. O combate à inflação tem que ser baseado em expansão de oferta, não em juro alto, que justifique os sacrifícios aos olhos do País pela sua combinação com iniciativas democratizantes, que permita que o câmbio continue a se desvalorizar e que assegure as nossas empresas inovadoras a faculdade de importar altas tecnologias, abandonar as restrições à importação de altas tecnologias, sejam tarifarias ou não tarifarias”. Completou.

Ao definir que o rumo que o País deve tomar não pode ser imposto unilateralmente pelo poder central, e deve sim, ser construído também debaixo para cima, o Ministro falou da politica regional e da estratégia nacional de desenvolvimento que destacou que só se efetivará no nosso País quando for traduzida em iniciativas para as grandes regiões, para os diferentes ‘Brasis’ que convivem dentro do Brasil. Segundo ele, “É ali que a estratégia nacional toca o chão da realidade. E é por isto eu estou andando o País, abordando cada um dos Estados, e em particular a Amazônia, o Nordeste e agora o Centro Oeste, que chamamos de Brasil Central”.

Ao observar que até hoje os Estados do Centro Oeste, do Brasil Central, nunca trabalharam juntos, o Ministro fez questão de destacar que a reunião em Goiânia marcou uma época na historia do Brasil, considerando ter sido a primeira vez os governadores do Brasil Central se reuniram e decidiram organizar-se a serviço de uma estratégia regional de desenvolvimento que sinalizasse um caminho para o País. “E não só decidiram organizar-se, mas decidiram também organizar um instrumento deles, uma instituição sobre o controle exclusivo deles, não do Governo Federal a ser chamada também de Brasil Central, para formular e implementar politicas comuns de desenvolvimento”. Contou.

A nova ideia da politica regional e o projeto de recuperação de áreas degradadas

Para Mangabeira, a ideia tradicional é que a politica regional é uma politica de compensações para o atraso relativo, e a nova ideia é que a vocação da politica regional possa acalentar vanguardas e vanguardismos alternativos no Brasil.

Sobre essa vanguarda, o Ministro disse entender que uma das grandes vocações produtivas no Brasil Central, que podem servir como pontos de partida para essa construção é a agropecuária e sua qualificação.

Para tanto, ele destacou a importância da formatação de um grande projeto regional de recuperação de pastagens degradadas. “A ideia é converter essas pastagens recuperadas num palco físico de um novo paradigma agropecuário. Uma combinação de pecuária intensificada com diversificação de lavouras perenes de alto valor agregados, associadas também ao cultivo de peixes e a manejo florestal sustentável”. Completou.

Para a prosperidade desse novo caminho o Ministro apontou a importância das inovações institucionais como a organização da assistência técnica, sobretudo para o pequeno e médio produtor e a reorganização dos mercados agrícolas para defender o produtor contra o cartel do lado da venda e da compra.

Como sendo uma segunda vertente para a vanguarda do setor, o Ministro destacou a importância da industrialização, que começaria pela convencional, avançando para uma nova industrialização, focada no conhecimento, na ciência e na tecnologia.

Segundo observou, a ponte entre essas duas etapas, o elo intermediário, seria uma industrialização focada na bioagricultura, na bioenergia, na bioquímica, e uma grande parceira na execução desta tarefa poderia ser a Embrapa. “O que estou propondo é que o Brasil central pule uma etapa, que ela salte da industrialização tradicional para uma industrialização do futuro, sem repetir o modelo da industrialização paulista do século passado. Não há por que o Brasil Central tenha de ser uma São Paulo tardia”.

A terceira e ultima vertente de vantagens comparativas, segundo o Ministro, é a logística. Ele afirmou que é no Centro Oeste que se esta construindo o centro dos grandes eixos nacionais de transporte. “O importante é que não sejam eixos vazios de escoamento, que sejam associados a uma proliferação de serviços e de indústrias, promovendo este vinculo entre diversificação produtiva e democratização de oportunidades, ligado ao fomento de uma rede de cidades médias no Centro Oeste que por sua vez dependem da provisão de serviços públicos de alta qualidade, de educação, de saúde e de segurança. Esse é o projeto”. Completou.

Para o sucesso da proposta, o Ministro afirmou existirem vários caminhos que podem e devem ser trilhados em paralelo, pelos Estados, que seria a formatação de uma nova escola média, analítica e capacitadora, uma escola media de ensino geral, e ainda a construção de um novo modelo de ensino profissionalizante, priorizando não só os ofícios rígidos e as profissões tradicionais, mas também focado nas capacitações praticas genéricas e flexíveis, exigidas pelas novas tecnologias que trazem as maquinas e equipamentos de hoje em dia.

Ao sugerir que os governadores do Centro Oeste devem sair na frente e organizar uma articulação politica dentro da federação para criar base politica para essas reformas o Ministro incentivou o Governador Reinaldo Azambuja a ser o principal agente a buscar um papel de vanguarda para o Brasil Central. “O Brasil não quer o Mato Grosso do Sul, um Brasil Central conformado, paciente, resignado, o Brasil quer a impaciência do Mato Grosso do Sul, o Brasil quer do Mato Grosso do Sul, rebeldia e ao se rebelar, contra o modelo de desenvolvimento que nega braços, asas e olhos ao dinamismo brasileiro o Mato Grosso do Sul falará pelo Brasil”. Finalizou.

IMG-20150708-WA0009Sobre o Programa de áreas degradadas que está sendo elaborado através da Secretaria de Produção e Agricultura Familiar o Governador Reinaldo Azambuja comentou que "Agora com uma lógica regional, a ideia que a Secretaria de Produção [e Agricultura Familiar] está construindo, vai ser passada ao Ministro para termos o Governo Federal como parceiro nisso". 

O programa, que passa por seus ajustes finais e deve ser lançado nos próximos meses pelo Governo do Estado, prevê a recuperação, a principio, de dois dos nove milhões de hectares de áreas degradadas existentes em Mato Grosso do Sul.

 

 

Matéria de Kelly Ventorim, com fotos de Jéssica Barbosa

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