A demanda global pela descarbonização da economia, como forma de frear o aquecimento global, está levando muitos países a estimularem a adoção de sistemas sustentáveis, como a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF). Os cenários e tendências da ILPF no mundo foram discutidos durante o II Congresso Mundial sobre sistemas ILPF, que aconteceu na terça e quarta-feira (04 e 05) de forma virtual.
Assim como no Brasil políticas como o Plano ABC e Plano ABC+ buscam ampliar a área com tecnologias de baixa emissão de carbono, países como Nova Zelândia e Austrália possuem políticas visando acabar com as emissões líquidas de carbono na agricultura e pecuária até 2030 e 2050, respectivamente.
De acordo com o palestrante Richard Eckard, da Universidade de Melbourne (AUS), há um incentivo para produtores plantarem árvores em pastagens e áreas de lavoura como forma de sequestrar carbono. O governo australiano, por exemplo, já vem realizando leilões de compra de créditos de carbono gerados por produtores.
Eckard mostrou ainda que o uso de árvores em sistemas silvipastoris com ovinocultura tem trazido benefícios relevantes, como a redução em 10% da morte de cordeiros devido ao conforto térmico gerado pela proteção tanto do calor quanto do vento em períodos frios.
“Créditos de carbono sozinhos não são capazes de fazer com que produtores plantem árvores. Mas combinando os benefícios múltiplos, isso pode incentivá-los. Estamos trabalhando para mudar isso”, afirma Eckard.
Demanda do mercado
Além de ser uma política dos governos, neutralização das emissões de carbono visa atender um mercado crescente por produtos com baixa emissão ou com emissão líquida zero de carbono. Grandes empresas já estão demandando esse tipo de produto, principalmente na Europa.
De acordo com Paul Burgess, da Cranfield University, no Reino Unido, algumas redes de supermercados inglesas já estão comprando apenas carnes vindas de fazendas que utilizam técnicas sustentáveis na pecuária. Esse movimento vem incentivando o aumento da adoção de sistemas silvipastoris. Já são adotados há anos em países europeus, esses sistemas agora estão sendo conduzidos com maior diversificação das espécies arbóreas.
A maior complexidade dos sistemas integrados, no entanto, é um desafio para os produtores europeus, que têm dificuldade de mão-de-obra no campo, disse o palestrante.
Os países da América Latina, por sua vez, têm nos sistemas ILPF a oportunidade de garantir o suprimento desse mercado cada vez mais exigente em produção sustentável de alimentos. Luis Valderrama, da Universidad de Colombia, diz que para esse potencial ser alcançado é preciso investimento dos governos, sobretudo apoiando pequenos agricultores. Para ele, a descarbonização da produção agropecuária pode trazer bom retorno aos produtores, com aumento da rentabilidade com a venda de madeira, de créditos de carbono e com recebimento de prêmio pago pela produção sustentável.
Segundo o Superintendente de Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia, Produção e Agricultura Familiar, Rogério Beretta de Mato Grosso do Sul, o Governo do Estado, através da Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar (SEMAGRO) tem como meta colocar o estado na condição de estado Carbono Neutro e para isso vem atuando fortemente na elaboração de políticas públicas que garantam o desenvolvimento sustentável da agropecuária. “Paralelamente vimos trabalhando na implementação da lei estadual de pagamentos por serviços ambientais e na busca por uma plataforma de cálculo das emissões e sequestro de carbono”. Completou.
Dificuldades
Na África e na Ásia os sistemas ILPF como são usados no Brasil ainda são raridade. Nesses continentes, as formas mais comuns de sistemas integrados são as agroflorestas e algumas poucas áreas com sistemas silvipastoris. O indiano e professor na University of Florida, P. K. Ramachandran Nair, explica que há dificuldade em obter estatísticas sobre a área de adoção de ILPF nesses países e que a estrutura fundiária, baseada em pequenas propriedades e com baixo nível tecnológico, dificulta a adoção.
“Se a ILPF for vista como uma tecnologia para adoção em larga escala e com intensificação da produção, o potencial de adoção é limitado na região. Muito mais por aspectos sociais e econômicos do que por questões de condições de terra e a clima”, afirma P. K. Ramachandran Nair.
Já nos Estados Unidos, Alan J. Franzluebbers, do USDA- North Carolina State University, mostrou que o setor agropecuário ainda vive um momento de alta especialização e concentração das terras, que resulta no mínimo uso de sistemas ILPF. Porém, ele afirma que o interesse pelos sistemas mais diversos começa a surgir na medida em que se observam os resultados econômicos. Questões ambientais, afirma, serão importantes para mudar as tendências.
O painel Sistemas de ILPF no Mundo foi moderado pelo pesquisador da Embrapa Solos e presidente do conselho gestor da Rede ILPF, Renato Rodrigues.
Congresso
II Congresso Mundial sobre Sistemas ILPF (World Congress on Integrated Crop-Livestock-Forestry Systems) ocorreu nos dias 4 e 5 de maio de forma virtual. Reunindo mais de 1.300 participantes, contou com 30 palestras e apresentação de 156 trabalhos científicos. O evento foi promovido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Embrapa, Rede ILPF, Federação de Agricultura e Pecuária do Mato Grosso do Sul e Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar de Mato Grosso do Sul.