Que Mato Grosso do Sul é destaque internacional na comercialização de carne bovina, isso não novidade. Entretanto, o Estado vem se destacando por alcançar, graças a sua qualidade, mercados cada vez mais exigentes, como a Cota Hilton, da União Europeia. É o caso da Fazenda Nossa Senhora das Graças, localizada em Caarapó/MS, que será destaque no Confinar 2016 – um dos principais eventos sobre pecuária de corte do país.
Em sua quinta edição serão abordados temas relacionados ao atual cenário econômico e as mais recentes tecnologias aplicadas à pecuária de corte, que acontecerá nos dias 31 de maio e 1º de junho no Centro de Convenções Rubens Gil de Camillo, promovido pela Beef Tec. Confira a entrevista:
Confinar 2016 – Em 2015, a Fazenda Nossa Senhora das Graças foi destaque na imprensa por ser uma das poucas propriedades do Estado que têm status de exportador da Cota Hilton. O que isso representa? E quais foram os caminhos trilhados até alcançar essa conquista?
André Bartocci – O Brasil é o maior exportador de carne bovina do mundo, e é o que mais vai crescer nos próximos anos e incomodar outros grandes produtores mundiais. Por este motivo os mercados importadores sempre são exigentes quando formulam normas para importar o “Brazilian-Beef”.
A cota Hilton, uma cota especial que isenta impostos de exportação para os produtores acessarem o mercado Europeu, é um exemplo disto. Ela é concedida para vários exportadores mundiais para que estes atendam as exigências qualitativas e principalmente de segurança alimentar dos consumidores europeus. Porém a quantidade da cota brasileira é uma das menores e as exigências para a adequação do produtor são as maiores.
Para o Brasil ela exige que os animais sejam rastreados e incluídos na lista Trace antes dos 10 meses de idade, que estes animais nasçam e sejam produzidos em áreas habilitadas para o mercado UE, alem de só consumirem vegetais. Estes animais ao abate devem ser classificados como TD (não possuir nenhum dente permanente), suas carcaças devem ser uniformes e o peso acima de 16@. Todas estas características e qualidades devem ser certificadas e auditadas com aprovação do Mapa – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
Portanto produzir Cota Hilton no Brasil é um pouco complexo além de burocrático. Por este motivo ela raramente é totalmente preenchida, mesmo o Brasil produzindo uma grande quantidade de animais de boa qualidade.
Nós da NSG começamos em 2002 a rastrear individualmente para cumprir as regras do Sisbov (Sistema Brasileiro de Identificação e Certificação de Bovinos e Bubalinos). Com o tempo implantamos sistemas de leitura ótica e atualmente todos os animais são rastreados eletronicamente com chips.
A Cota Hilton remunera bem quem consegue produzir dentro das normas, mas os maiores ganhos são internos. Com a rastreabilidade individual, conseguimos um controle maior da produção, uma correção mais rápida de erros e um melhor planejamento de uma atividade tão complexa como a Pecuária Tropical Brasileira.
Confinar 2016 – A propriedade recebeu a Medalha de Ouro da Embrapa, prêmio que instituiu o programa de Boas Práticas Agropecuárias. Essa vitória incentiva a novas conquistas? Comente como foi o recebimento deste mérito.
André Bartocci – A pecuária precisa evoluir. Porém necessita de algumas ferramentas de gestão para tornar esta complexa atividade passível de evolução. O BPA – Boas Práticas Agropecuárias é uma importante aliada neste sentido. Ele foi desenvolvido para mensurar o real estágio de cada fazenda nos níveis zootécnicos, financeiros, trabalhistas, ambientais, sociais e também para traçar metas para seu desenvolvimento. Portanto, serve como suporte para qualquer produção independente do nível que ela esteja. Sempre buscando uma evolução sustentável.
Em 2011, nós implantamos o protocolo e fomos a primeira fazenda do Brasil a conseguir a categoria máxima o BPA-OURO. Além de monitorar todas as fases e processos da fazenda, a implantação da certificação nos fez refletir e pensar em Equipe. Considero este o maior ganho: Todos pensando e agindo com um objetivo comum. Outro ponto importante do Certificado é que ele é dinâmico e, depende sim de instalações e estruturas, mas depende muito mais do compromisso das pessoas envolvidas.
Sabemos que nosso maior valor é nosso Grupo, e nele incluímos todos que trabalham ou moram na N.S.G. Nosso cuidado com o bem estar de nossas famílias é intenso. Todas as casas fazem coleta seletiva, o esgoto vai para fossas sépticas regularizadas e a água consumida é analisada periodicamente. Todos possuem acesso à internet e telefone. Além disto, possuímos planos de saúde para menores e incentivamos a formação acadêmica. Além de capacitação e cursos para toda a Equipe.
Nós, da N.S.G., temos a convicção que a prosperidade de uma produção não depende da fertilidade dos seus solos, da topografia de suas terras ou da genética de seus animais e de suas plantas, pois sabemos que o segredo do Sucesso esta na qualidade e no compromisso de suas Pessoas. O BPA nos ajudou a enxergar isto.
Confinar 2016 – A fazenda consegue atingir 18 arrobas, em 30 meses, duas arrobas a mais que a regra exigida pelos europeus, referente a Cota Hilton. Como conseguir esse patamar? Onde estão os maiores investimentos? Genética, alimentação? Além disso, a lotação é de três animais por hectare, mais que o dobro da média nacional. Isso representa sustentabilidade e eficiência. Comente um pouco sobre como alcançar esse patamar?
André Bartocci – A produção Pecuária Tropical é um sistema complexo. Trabalhamos com Animais e Plantas que são suscetíveis a clima, a relevo, a fertilidade, a manejo, a genética. É no mínimo o dobro de todas as variáveis que devemos observar para termos bons resultados se compararmos com a agricultura.
Precisamos estar atentos a qualidade dos animais sim, mas o grande gargalo em uma produção Tropical é a alimentação. O manejo de pastagem e as estratégias de entressafra são essenciais para alcançar uma boa produtividade.
A taxa de lotação, que no Brasil gira em torno de 0,8UA/há é um numero relativo e em ultima análise somente mede estoque do rebanho. Trabalhamos com altas lotações , mas na NSG, o numero buscado é a taxa de produção que é a quantidade de quilos ganhos por ha (Kg/há/ano) ou o produto da lotação e o ganho de peso individual (lot X Gp/cab).
Na produção,nosso foco é na célula de produção que é o hectare. Nossa meta é produzir mais que 550 kg/hec/ano é este numero que mede a eficiência da produção.Como trabalhamos com integração com lavoura, áreas que produzem abaixo de 500kg/há/ano são direcionadas para a reforma através do plantio de soja por dois anos, posteriormente retornamos pastagens.
Confinar 2016 – Qual a meta para os próximos anos e quais as maiores dificuldades enfrentadas?
André Bartocci – A comunicação da cadeia pecuária(Produção, Industria Varejo e Consumidor) vai muito mal. A Produção e a Indústria precisam falar pelo menos o mesmo idioma! Este problema afeta mais os produtores, principalmente em épocas de frigoríficos e varejo tão concentrados.
Então precisamos fomentar sua solução nos próximos anos, não podemos ficar somente reclamando do rendimento de carcaça, do preço da @, do frigorífico que quebrou… Com união e boa representatividade podemos e precisamos fazer mais.
Dentro da fazenda, nosso desafio é olhar para o chão. Olhar para o subsolo onde estão as raízes dos pastos que sustentam nosso negócio. Precisamos entender muito mais de plantas, de sua genética, da sua fertilidade, de suas variedades, de seu manejo, enfim de sua interação com os animais. Precisamos nos conscientizar que antes de sermos produtores de bois, somos agricultores de pastagens!
Existe um grande potencial de transformação de gramíneas em proteína animal na Pecuária Tropical Brasileira ainda não desenvolvido. Explorar este potencial é nosso especial desafio para os próximos anos.
Ana Brito