Diminuir em um ano a idade de abate do rebanho e ainda colaborar para reduzir a emissão na atmosfera de aproximadamente 1,5 de tonelada de gás carbônico equivalente por ano, quantia produzida por apenas um animal adulto. A conta pode virar realidade e ser conquistada por produtores rurais, desde que levem em consideração algumas ações que visem, principalmente, à pecuária mais eficiente, com destaque para a recuperação de pastagens degradadas.
A constatação vem de especialistas da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que indicam suas mais recentes pesquisas, aproveitando o período da realização da Conferência do Clima – COP21. O evento promovido pela Organização das Nações Unidas (ONU), em Paris (França), começou nesta segunda-feira, 30 de novembro, e segue até 12 de dezembro, com representantes de 195 nações.
Durante o encontro, a intenção é fazer com que todos os países cheguem a um acordo para reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa. A principal meta é limitar em 2ºC o aquecimento da atmosfera, até 2100, em comparação aos níveis pré-industriais.
Dados da Embrapa mostram que a pecuária brasileira pode colaborar na redução de CO₂ no meio ambiente. No País, são abatidos cerca de 40 milhões de cabeças por ano. Se metade deste rebanho for criado em sistemas mais eficientes, estima-se a queda da emissão de 30 milhões de toneladas de gás carbônico equivalente por ano. E esta meta pode ser alcançada somente com a diminuição da idade de abate, ou seja, sem considerar, por exemplo, a fixação de carbono no solo pelo mesmo sistema.
Conforme a estatal, se 12,5 milhões a 18,4 milhões de áreas de pastagens forem recuperadas será possível elevar a produção de carne bovina entre 2,4 milhões a 3,6 milhões de toneladas por ano, o que pode significar um aumento de quase 33%.
Hoje, a produtividade média brasileira gira em torno de 45 quilos de carne por hectare. Mas com sistemas recuperados e melhorados, defende a Embrapa, esta produtividade subiria tranquilamente para 120 quilos por hectare, em sistemas de cria-recria e engorda (ciclo completo), propiciando, inclusive, mais renda para o pecuarista.
A Embrapa destaca que maior parte das terras usadas na agropecuária brasileira está ocupada com pastagens: de um montante de quase 180 milhões de hectares, mais da metade passa por algum estágio de degradação. Também deste total de hectares, apenas 10% das pastagens brasileiras adotam sistemas pastoris menos impactantes, como pousio, rotações e Integração-Lavoura- Pecuária (ILP). Só no Cerrado são 32 milhões de hectares, cuja qualidade do pasto está abaixo do esperado, informa a Empresa.
CONDIÇÕES DO SOLO
Presentes em todo o País, estas pastagens degradadas possuem baixa capacidade de produção de carne e de leite; e geralmente ainda sofrem com a erosão laminar, em sulcos e até voçorocas, que podem causar perdas de mais de cem toneladas de solo or hectare por ano. Isto, de modo mais amplo, compromete a sustentabilidade do sistema de produção.
Em várias situações, assegura a Embrapa, apenas mudando algumas técnicas de manejo é possível reduzir estas perdas para menos de dez toneladas por hectare por ano, podendo chegar a menos de uma tonelada/ha/ano em áreas bem manejadas. Isto se aproxima do que acontece, normalmente, em solos sob vegetação preservada.
Apesar disto, não é apenas o mau uso o responsável pelo estado degradante de parte das terras brasileiras. “A maior parte dos solos brasileiros é ácida e com baixa disponibilidade de nutrientes. Caso estes poucos nutrientes retirados pelas culturas não sejam repostos no solo, as pastagens entram em processo de degradação. Desta forma, a falta de um correto manejo do solo para a implantação e a manutenção da pastagem é que pode definir a maior velocidade de degradação”, ressalta Wadson da Rocha, pesquisador da Embrapa Gado de Leite (MG).
Para amenizar a situação, a Embrapa Solos (RJ) propõe a reinserção destas terras com pastagens degradadas ao sistema produtivo agropecuário sustentável, o que seria uma grande oportunidade para aumentar a produção agropecuária, sem precisar da ampliação da fronteira agrícola.
“Para isto, precisamos identificar e eliminar os fatores responsáveis pela degradação; e fazer uma avaliação do estado de degradação do sistema solo-planta. Neste sentido, a análise integrada de indicadores de qualidade do solo com indicadores de qualidade da forragem e com a quantidade de biomassa produzida podem possibilitar maior eficiência na seleção, no desenvolvimento e na adoção de tecnologias adequadas aos diferentes níveis de degradação”, avalia o pesquisador Aluísio Granato de Andrade, da Embrapa Solos.
RECUPERAÇÃO DE PASTAGENS
A estatal aponta que, no Brasil, as principais causas da degradação das pastagens são o excesso de lotação e manejo inadequado; a falta de correção e adubação na formação, aliada à falta de reposição dos nutrientes pela adubação de manutenção; e a utilização de espécie ou cultivar inadequada, não adaptada ao clima, solo e objetivo da produção.
Para recuperar áreas degradadas, é necessário incluir o diagnóstico da degradação das terras, que é possível fazer a parti da divisão destes espaços em glebas homogêneas, conforme algumas características (relevo, topografia, cobertura vegetal, solos, uso atual, produtividade das culturas e histórico de exploração, adoção de práticas conservacionistas e tipo e frequência dos processos erosivos).
“Devemos também observar a diferença entre degradação e esgotamento do solo ou do pasto”, indica o consultor independente e doutor em planejamento de uso das terras Antonio Ramalho Filho.
Durante o diagnóstico, também é recomendado avaliar a taxa de infiltração de água no solo e a ocorrência de camadas compactadas; além da necessidade de coletar amostras da terra para avaliação da granulometria e da fertilidade; e ainda descrever a cobertura vegetal natural e/ou o uso atual e as práticas de manejo existentes.
Pesquisador da Embrapa Gado de Leite, Carlos Eugênio Martins cita outro importante passo na recuperação de pastagens: o processo de restabelecimento da capacidade produtiva de uma espécie forrageira previamente estabelecida. “A renovação seria a substituição da espécie forrageira, anteriormente instalada, por meio de práticas agronômicas de manejo de solo e planta”, revela.
SELEÇÃO DE PRÁTICAS
Após a conclusão do diagnóstico, o avaliador deve selecionar as práticas para a recuperação da capacidade produtiva do solo. Elas podem ser mecânicas, que visam à ordenação e dissipação de energia das águas do escoamento superficial e a promoção da infiltração de água e retenção de sedimentos.
Também podem ser práticas edáficas, que estão relacionadas ao manejo da fertilidade com aplicação adequada de adubos e corretivos, assim como de condicionadores do solo que favoreçam o aumento da disponibilidade de água para as plantas em períodos de estresse hídrico.
Por fim, as práticas para recuperação de pastagens podem ser vegetativas, que equivalem à seleção e ao manejo de plantas, em rotação, consórcio ou sucessão para fins de produção, proteção do solo, fixação biológica de nitrogênio, fornecimento de matéria orgânica, ciclagem de nutrientes, descompactação biológica e estruturação do solo. Este conjunto de atividades promove a preservação e melhoria da estrutura do solo. Os sistemas de plantio direto, agroecológicos, agroflorestais e ILP são bons exemplos de manejos que contribuem para conservação e recuperação do solo.
“A degradação das terras pode ser evitada pelo uso de boas práticas agrícolas utilizando-as de forma a manter ou melhorar as propriedades químicas, físicas e biológicas do solo, manejando suas limitações e potencialidades para a produção agrícola, possibilitando maior agregação, armazenamento de água e disponibilidade de nutrientes essenciais para o crescimento vegetal”, destaca o pesquisador Aluísio Granato de Andrade, da Embrapa Solos.
COP21
De acordo com a Embrapa, a recuperação de pastagens degradadas é um dos compromissos assumidos pelo Brasil na COP-15 (realizada em Copenhague, 2009), que prevê a redução das emissões de gases de efeito estufa, projetadas para 2020, entre 36,1% e 38,9%. Desta forma, foi estimada a redução na ordem de um bilhão de toneladas de CO₂. Tais metas foram ratificadas na Política Nacional sobre Mudanças do Clima.
No caso específico da agricultura, destaca a estatal, foi estabelecido o “Plano Setorial para a Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura” (Plano ABC), por meio do qual o País assume o compromisso de recuperar 15 milhões de hectares de pastagens degradadas nos próximos cinco anos. Assim que alcançar este objetivo, o Brasil deve ampliar a produção de alimentos e bioenergia e reduzir a necessidade de desmatamento para a expansão agropecuária.
“Desta forma, além de contribuir para a geração de emprego e renda, estas áreas degradadas, quando recuperadas, podem prestar serviços ecossistêmicos, como o controle da erosão, a regulação da recarga hídrica e o aumento do estoque de carbono no solo”, afirma Andrade.
Por equipe SNA/RJ com informações da Embrapa Solos