A carne bovina brasileira é motivo de orgulho para os dois lados das cercas das fazendas: os criadores de gado e os mais variados tipos de empresas da cadeia produtiva. Qualidade gera quantidade. Por isso mesmo, não deveria causar surpresa a recente informação do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) de que a carne do Brasil estabelece novos recordes. De acordo com estudos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), o rebanho bovino de corte do País cresceu 25% nos últimos 15 anos, período em que a produção de carne alcançou incremento de 45%.
O Brasil tem o maior rebanho comercial do mundo, 214 milhões de cabeças de gado – número superado apenas pela Índia, onde, no entanto, imposições religiosas restringem os matadouros e o consumo de carne. Em 2015, de acordo com a Embrapa, o Brasil produziu 9,2 milhões de toneladas de carne e o principal fator para a evolução desses números foram os ganhos em rendimento, decorrentes dos resultados da modernização da pecuária brasileira, considerada competitiva e sustentável.
As exportações evoluíram, os produtos brasileiros são mais respeitados internacionalmente. A criação de gado e a indústria da carne garantem milhões de empregos e bilhões de dólares de faturamento e de impostos. São notícias de um Brasil que dá certo e que animam os demais setores nacionais a tentar colaborar pelo fim da atual crise política, econômica e moral.
A propósito dessas recentes informações positivas e do fato de estar programado para a segunda quinzena de maio um importante evento internacional sobre saúde animal, desejo recordar minha experiência ocorrida no ano 2000. Como jornalista, tive a oportunidade de ir a Paris, em maio daquele ano, para fazer a cobertura de um acontecimento histórico, no congresso da Organização Mundial de Saúde Animal (OIE), em que grande parcela do território brasileiro seria declarada livre de febre aftosa com vacinação. Apenas para recordar: até então, só Santa Catarina e Rio Grande do Sul haviam alcançado tal status, assegurando mais credibilidade para a exportação de carne e de produtos derivados.
O congresso da OIE de 16 anos atrás, na sede da entidade, na Rue de Prony, perto do Arco do Triunfo, decidiu que os estados de Mato Grosso, Goiás, São Paulo e Paraná, o oeste de Minas e o Distrito Federal, detentores de mais da metade do rebanho do Brasil, também seriam internacionalmente liberados, com o compromisso de manterem o hábito da vacinação anual contra a febre aftosa. Uma vitória dos produtores rurais e dos governos federal, estaduais e municipais, engajados na antiga luta contra uma doença totalmente banida nos países desenvolvidos.
Quem discursou pelo Brasil na sessão de abertura do congresso da OIE foi o ministro da Agricultura, Marcus Vinicius Pratini de Moraes, que exerceu o cargo de 1999 a 2003. Pratini reafirmou o compromisso do país de ser verdadeiro celeiro do mundo, fornecendo alimentos de qualidade. Com a oficialização daqueles estados como livres de aftosa, a tendência seria aumentar as exportações. Foi nessa tecla que o ministro bateu no dia seguinte, numa entrevista coletiva na Embaixada do Brasil em Paris, ocasião em que previu que, em cinco anos, o Brasil seria o maior exportador de carne bovina do mundo.
Apontado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso como “o ministro das boas notícias”, Pratini estava certo. Não só a produção tem aumentado: hoje em dia, quase todo o território brasileiro está livre da febre aftosa, porém, seguindo as regras da vacinação. A missão prosseguiu, sob os governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. A doença do gado foi sendo varrida. Em 2014, o norte do Pará e os estados nordestinos de Alagoas, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Norte entraram na lista positiva da OIE, fechando o ciclo. O estado de Santa Catarina é considerado zona livre de febre aftosa sem vacinação desde 2007.
De 22 a 27 de maio, vai ocorrer, na mesmo prédio da OIE, na Rue de Prony, e no auditório da Maison de La Chemie, o 84º Congresso Geral da OIE, entidade com 180 países filiados. O Brasil, mais uma vez, lá estará. Agora como um respeitado produtor do campo e da indústria da carne.
Mesmo a distância, estarei de olho no evento. Graças à internet, receberei boas notícias e poderei recordar a agitação vivida em 2000. Visitei a Europa várias vezes em minha carreira jornalística, mas aquela foi uma das melhores passagens pela França: além de ter trabalhado na cobertura do congresso da OIE, tive dois momentos de lazer em torno do esporte e da música.
Com a ajuda de um dos então correspondentes do jornal O Estado de S.Paulo em Paris, meu amigo Napoleão Sabóia, pude presenciar um fato inédito, a primeira decisão da Liga de Campeões da Europa entre dois times de um mesmo país – no caso, a Espanha: Real Madrid e Valencia. O Stade de France, construído para a Copa do Mundo de 1998, ficou lotado, com a invasão de Paris por 50 mil espanhóis. Um belo jogo, em 19 de maio. O Real fez a festa: 3 a 0.
No dia seguinte, presenciei “Bibi canta Piaf”, num pequeno teatro parisiense, em que a fantástica atriz e cantora brasileira Bibi Ferreira cantou músicas eternizadas pela magnífica francesa Edith Piaf (1915-1963), entre as quais “La Vie en Rose”, espetáculo mais tarde apresentado também no Brasil.
A vida em rosa. Só não vê fatos positivos quem não quer. Coitado de quem não não quer ou não consegue ver.
Sobre o autor
Luiz Carlos Ramos, de São Paulo, desenvolve uma carreira jornalística que completou 52 anos em 2016, com multiplicidade de tipos de mídia e com ampla variedade de temas, além de acumular 27 anos como professor de Jornalismo na PUC-SP. Tornou-se colaborador da CarneTec para escrever crônicas em torno de curiosidades sobre a carne. Nestes textos, ele aplica o conhecimento adquirido em coberturas sobre agropecuária para jornais e revistas em oito países e em sete estados do Brasil.
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