No seminário “A dimensão econômica da sustentabilidade na agropecuária brasileira”, realizado na Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da USP) recentemente, foi lançada uma publicação com três estudos que revelaram novidades sobre a dimensão econômica da sustentabilidade na agropecuária brasileira.
Os estudos são resultado de mais de um ano de uma colaboração multidisciplinar e institucional entre o Imaflora, o Cepea-Esalq, o Rabobank e o Sebrae.
As pesquisas tinham como principal propósito avaliar se a implementação da sustentabilidade ou a adoção de boas práticas de gestão e desempenho socioambiental resultam em um diferencial ou uma vantagem competitiva para o fortalecimento do negócio do produtor rural.
Para tanto, os pesquisadores avaliaram grandes bancos de dados com informações a respeito do desempenho socioambiental e econômico de um grande número de produtores afetados pela política socioambiental do Rabobank, pelo programa de assistência técnica do Educampo do Sebrae-MG ou por um sistema de certificação socioambiental.
A principal conclusão foi que produtores que adotam programas de sustentabilidade e gestão têm melhor saúde financeira, melhor resultado econômico e são mais competitivos. Além disso, a gestão e a sustentabilidade podem também ser alcançadas por pequenos e médios produtores organizados em processos coletivos.
Por fim, ficou claro que o crédito, instrumentos de mercado como a certificação e a assistência técnica podem influenciar a adoção e apoiar a implementação de boas práticas, gestão e sustentabilidade na agropecuária.
Contudo, as pesquisas identificaram uma lacuna de políticas públicas que apoiem a melhoria da gestão e a implementação da sustentabilidade para o produtor rural. A fragilidade da assistência técnica e extensão rural é uma grande barreira.
Aos poucos, parâmetros de sustentabilidade tem permeado algumas politicas, inclusive o crédito, mas ainda de maneira marginal. As métricas de produção e produtividade que costumam medir o sucesso do setor tornam invisíveis os desafios e as complexidades para uma produção sustentável.
Estas conclusões foram debatidas no seminário por uma mesa redonda formada pelos ex-ministros da agricultura Roberto Rodrigues e Luís Carlos Guedes Pinto, Vitor Osaki (Diretor do Mapa), Nelson Ananias Filho (CNA), Carlos Vian (professor da Esalq) e Annelise Vendramini (GV Ces).
Eles foram provocados a refletir sobre como os exemplos de sucesso do Rabobank, do Educampo e da certificação podem contribuir para o aprimoramento das políticas públicas visando o fortalecimento da sustentabilidade da agropecuária brasileira.
O debate alertou que é necessário considerar que os produtores que participam desses programas inovadores já são diferenciados por natureza. Além disso, a agropecuária brasileira é extremamente diversa, desigual e concentrada em um pequeno número de produtores tecnificados que respondem pela maior parte da produção e da riqueza gerada no campo.
A maior parte dos produtores brasileiros está à margem da influência ou da participação em qualquer política pública, seja de crédito ou assistência técnica.
Assim, além de transformar este pequeno grupo tecnificado para um padrão mais sustentável, existe um enorme desafio de incluir a grande massa de agricultores brasileiros num processo de educação, gestão e dos primeiros passos visando uma melhor qualificação para uma futura adesão à sustentabilidade.
Ficou claro que a formulação e a implementação de políticas que influenciam o setor agropecuário é segmentada, envolve diversos ministérios e que é necessária uma articulação de todo o governo para o sucesso de qualquer iniciativa.
Destacou-se que os mecanismos de política pública de comando e controle são relevantes para evitar situações predatórias e degradantes, mas uma mentalidade e prática de incentivos é fundamental para entrar na espiral de melhoria contínua e mudanças rumo a um patamar diferenciado.
O código florestal e o pagamento por serviços ambientais foram citados como leis que deveriam ter incentivos concretos. Foi recordado que isto já ocorreu em nossa história, como no caso dos índices de produtividade e da cédula C (com desconto no imposto de renda), que incentivaram os produtores a aderir à tecnologia e foram muito importantes para um salto na produtividade brasileira.
Além disso, o crédito deve ser articulado com outros instrumentos que considerem o risco da produção e proteja o faturamento ou a renda do produtor rural. Estes mecanismos complementares, como o seguro, podem ser os melhores meios para a incorporação de parâmetros de sustentabilidade, ao invés de serem embutidos diretamente no próprio crédito.
Especulou-se que esta nova articulação do crédito com outros instrumentos pode resultar em um impacto muito mais positivo para os produtores e para o interesse público, com o mesmo montante de recursos destinado atualmente.
Foi proposto considerar a elaboração de instrumentos de política pública que coordenem a cadeia produtiva como um todo, como ocorre em alguns países. Atualmente a riqueza é apropriada em grande medida pelos elos antes e após a produção. É necessário diminuir o risco do produtor e distribuir com maior equidade a geração de riqueza de todo o setor.
A necessidade do resgate da assistência técnica e da extensão rural para qualquer projeto de fortalecimento e melhoria da agropecuária brasileira foi enfatizada. Esta deve passar necessariamente por um fortalecimento e priorização do cooperativismo.
Somente a união dos produtores pode se contrapor à concentração e ao enorme poder dos demais elos da cadeia sobre a organização e tomada de decisão do produtor rural.
Enfim, os estudos e o seminário atingiram seus objetivos e deram subsídios para a formulação de uma agenda de aprimoramento das políticas públicas para o setor agropecuário, que deve ser desenvolvida futuramente.
LUÍS FERNANDO GUEDES PINTO, engenheiro agrônomo e doutor em Agronomia, é gerente de certificação do Imaflora e integra a Rede Folha de Empreendedores Socioambientais