A expressiva produção de soja em Mato Grosso e que inspirou o enredo de escola de samba neste Carnaval terá redução mais acentuada que a previsão traçada pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), no 5º Levantamento da Safra de Grãos, divulgado na semana passada. Neste início de colheita, a Conab estima uma redução de 562 mil toneladas do grão no Estado e oferta total de 27,456 milhões (t).
Meses antes, o Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea) sinalizou para perdas de 1 milhão (t) da oleaginosa e prejuízo financeiro que poderia chegar a R$ 1 bilhão para os produtores. Estes, por sua vez, não descartam uma quebra de safra ainda maior, que poderá chegar a 2 milhões de toneladas.
Se confirmada a projeção pessimista, a oferta estadual cai para 26 milhões (t) na safra 2015/2016. As condições climáticas que marcaram o cultivo da oleaginosa no atual ciclo, caracterizado por estiagem no início do plantio e chuvas mais intensas na fase de desenvolvimento do grão, são inéditas para os produtores mato-grossenses.
Em algumas propriedades, sojicultores colheram 6 sacas por hectare, diz o secretário municipal de Agricultura e Meio Ambiente de Sorriso, Afrânio Cesar Migliari. “Estamos com vários laudos apresentando a frustração na produção deste ano. Em alguns casos, as perdas foram muito fortes”.
Ele diz que “há de tudo”, com propriedades registrando baixíssimo rendimento e péssima qualidade do grão, enquanto outras garantiram uma produtividade elevada. “Mas, estamos em plena safra. Há casos muito ruins e outros muito bons. Na média geral, ainda deve ficar favorável, mas há situações de produtores que perderam tudo, primeiro com a seca e depois com as chuvas”.
Em Sorriso, onde são colhidas cerca de 2,2 milhões de toneladas de soja – volume que alçou o município ao patamar de maior produtor nacional da oleaginosa – a expectativa é obter 1,8 milhão (t) do grão nesta temporada, complementa o vice-presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja), Elso Pozzobon. “No início do plantio foi quantificada a perda de 1 milhão de toneladas de soja em Mato Grosso, mas hoje pode ser o dobro disso”.
Para o secretário Afrânio Cesar Migliari, a quebra total da safra de soja no município irá ultrapassar tranquilamente 500 mil toneladas. “Aqui já foram colhidos 30% da área plantada e esse volume de perdas é registrado somente na região do Barreiro, que responde por 20% da nossa produção municipal, com 150 mil hectares de soja plantados”.
Pozzobon lembra que os dados gerais da colheita estão sendo levantados e a tendência é decretar estado de emergência. Conforme ele, as regiões Norte e Leste são as mais prejudicadas pelas adversidades climáticas decorrentes do fenômeno El Niño. “Além de Sorriso, municípios como Vera, Ipiranga do Norte, Gaúcha do Norte, Nova Xavantina, Canarana e toda a região do Araguaia foram bastante afetadas”.
Em Sorriso, na sexta-feira (5) à noite, os produtores filiados ao Sindicato Rural do município pleitearam a oficialização da situação de emergência ao Executivo municipal, que deverá decidir pelo Decreto de Situação de Emergência nos próximos dias, confirma Migliari.
Com a medida, os produtores poderão obter auxílio na renegociação das dívidas com bancos e tradings – multinacionais exportadoras de grãos -, observa o secretário municipal de Agricultura. Em Ipiranga do Norte, o pedido de socorro dos produtores foi formalizado pela prefeitura local aos governos estadual e federal e outros municípios mato-grossenses cogitam recorrer à medida esta semana, como é o caso de Nova Ubiratã e Vera.
Ainda assim, o reflexo das perdas no campo será sentido em outras atividades econômicas, pondera Migliari. “Neste momento estamos em plena safra, ainda há demanda por mão de obra, mas o reflexo dessa quebra na produção deve ser sentido mais à frente. Se há uma produção menor, a movimentação de recursos também cai. Se um trabalhador recebe participação na produção, passará a ganhar menos. Além disso, o custo dessa safra está muito alto devido à disparada na cotação do dólar”.
O vice-presidente da Aprosoja diz que o comércio, por exemplo, já sente o impacto dos prejuízos nas lavouras de soja. “Ainda mais porque é um setor que já vinha experimentando dificuldades. Notamos até uma certa ansiedade dos comerciantes em saber como será o rendimento das lavouras, há uma grande expectativa”.
COLHEITA – De acordo com o último boletim semanal divulgado pelo Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), no fechamento do mês de janeiro todas as 7 regiões mapeadas apresentaram queda na produtividade das lavouras de soja, com destaque para o Médio-Norte (-5,52%). Na principal região produtora do Estado, a produtividade baixou da média de 52 sacas por hectare na safra 2014/2015 para 49 sacas/ha no atual ciclo produtivo.
No geral, o rendimento médio esperado das lavouras mato-grossenses é de 50 sacas de soja por hectare nesta safra, ante quase 52 sacas/ha na temporada anterior. Até agora, a colheita segue mais adiantada na região Norte, com 17,85% dos 277 mil hectares plantados já colhidos. Contudo, em comparação com a safra 2014/2015, o trabalho está atrasado em 14,66 pontos percentuais em relação ao mesmo período do ano passado.
Situação oposta é registrada no Nordeste mato-grossense, onde foi colhido até agora 1,80% dos 1,519 milhão (ha) ocupados com soja. Comparado com o ritmo de colheita na última safra, o trabalho está mais acelerado em 1,08 ponto percentual, registra o Imea.
No fim de janeiro, cerca de 8,2% das lavouras de soja em Mato Grosso tinham sido colhidas. “Com o clima mais favorável para a colheita da soja na última semana de janeiro, as atividades avançaram (…) e reduziram o atraso em relação à safra passada. (…) Mesmo assim, a produção disponível da safra 2015/2016 é reduzida, apenas 2 milhões de toneladas até agora, e por isso os tradicionais recuos mais acentuados nos preços disponíveis no mercado ainda não ocorreram neste ano”, registram os analistas do Imea no boletim semanal.
Outro aspecto observado pelos analistas é a antecipação da elevação do custo do frete este ano, com a aceleração do ritmo de colheita e aumento do volume de soja disponível.
MILHO – As precipitações pluviométricas acima da média em janeiro atrasaram o início da colheita da soja e, por consequência, o plantio do milho. Até agora foram semeados 5,45% da área total prevista para ser ocupada com o cereal em Mato Grosso, na atual safra. De acordo com o Imea, nesta temporada muitos produtores assumiram o risco de semear o milho fora da janela ideal de plantio e isso pode levar a baixos índices de produtividade.
Estimativas apresentadas pelo Imea sinalizam para um rendimento médio de 95 sacas por hectare na safra 2015/2016, ante a média de 106 sacas por hectare na última safra. Espera-se que a produção estadual de milho alcance 19,361 milhões (t) neste ciclo, com o plantio de 3,378 milhões de hectares. Na última temporada foram colhidas 21,205 milhões (t) de milho, em área equivalente à da safra atual. “Identificamos a intenção dos produtores de milho em aumentar em 2,5% a área plantada e isso pode ocorrer em função de áreas de soja que não tiveram desenvolvimento”, pondera o vice-presidente da Aprosoja.
Silvana Bazzani, A Gazeta