Encontro de Analistas realizado pela Scot Consultoria foi o palco do debate de soluções para a “desorganização econômica”
O presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho), Alysson Paolinelli, disse nesta sexta-feira, (27/11), que a volatilidade cambial é uma das maiores preocupações do setor, mas isso deve persistir no curto prazo. Em debate no Encontro de Analistas realizado pela Scot Consultoria, em São Paulo, o representante afirmou que a oscilação da taxa de câmbio é um reflexo da “desorganização econômica” no País e defendeu que não haja intervenção do governo no câmbio.
“Uma economia que nos traz surpresas a cada dia deixa sempre uma incógnita muito grande para o setor produtivo. O que mais nos preocupa é que a instabilidade no câmbio não vai parar por aqui”, ressaltou em sua fala. Paolinelli disse que isso deve provocar impacto nos custos ante a dependência do País de insumos produzidos no exterior. “O Brasil ainda é muito dependente na compra de insumos e produtos e nós estamos sem nenhum planejamento estratégico para buscar autossuficiêncianestas áreas”, comentou.
A posição de Paolinelli foi complementada pelo presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Gustavo Junqueira, que avaliou que a taxa básica de juros do Brasil, a Selic, também é um reflexo da “desorganização econômica” citada pelo líder da Abramilho. Junqueira disse que há pouca eficácia na taxa atual, de 14,25% ao ano, em virtude de problemas nas contas públicas. Já o gestor de Produtos e Desenvolvimento de Concessionárias da AGCO no Brasil, Bernhard Kiep, que também é produtor rural, salientou que a alta do dólar, que traz maior receita na exportação, não necessariamente significa maior renda aos pecuaristas.
O professor titular da Universidade de São Paulo (USP) Décio Zylbersztajn afirmou que o governo está de mãos atadas em relação aos juros e ao câmbio, mas deve agir no que é de sua competência, fazendo o ajuste fiscal. “E quanto mais se deterioram as condições de governabilidade, maior a condição de fazer a política fiscal que precisa ser feita”, opinou, acrescentando que não considera que o governo esteja engajado no ajuste fiscal.
Gustavo Junqueira afirmou que produtores rurais da Argentina se prepararam nos últimos anos para uma eventual baixa nos impostos à exportação, ampliando estoques de commodities para vendê-los com maior margem no futuro. “A Argentina hoje tem US$ 8 bilhões armazenados em milho, trigo e soja. Parece pequeno, mas basta comparar com a reserva do país em moeda estrangeira, que está em torno de US$ 27 bilhões”, disse. Junqueira defendeu que o governo brasileiro deveria se aproximar do recém-eleito presidente da Argentina, Mauricio Macri, para negociar como se dará a “desova de estoques” no mercado internacional.
“Produtores argentinos estão há anos com estoques e precisam gerar liquidez. Isso pode derrubar os mercados internacionais. Talvez não afete diretamente a carne, mas isso vai afetar outras culturas”, comentou. O presidente daSRB também alertou que a China é parceira mais próxima da Argentina que do Brasil – e pode tomar para si os estoques. Se este for o caso, o país teria condições de “passar a arbitrar os mercados com os US$ 8 bilhões”.
O gestor do fundo de investimentos Sparta, Victor Nehmi, revelou que apostava na queda dos preços dos grãos, mas que tem revertido suas posições nos últimos meses. “Com o El Niño, desorganização climática e desestímulo à produção, não estamos mais vendidos. Estivemos nos últimos meses revertendo”, afirmou no encontro promovido pela Scot Consultoria.
O gestor também antecipou que fundos estão de olho em outras oportunidades de investimento e veem na Bolsa de Valores de São Paulo oportunidades de expandir seus ganhos. “Acho que o driver agora será, pasmem, comprar ações. As ações estão muito baratas”, afirmou Nehmi, que prevê que o Ibovespa possa retomar os níveis de 70 mil ou 80 mil pontos, quando houver condições para uma transição no governo, seja em breve ou em 2018.
Em suas ponderações finais, Gustavo Junqueira se disse preocupado com o produtor que atua somente na engorda e antecipa margens negativas, a depender de como os produtores vão negociar lotes de bois magros nos próximos anos. A respeito dos grãos, presidente da SRB criticou o Plano Safra 2015/16.
“O anúncio do plano deste ano foi uma verdadeira pedalada política. Não houve dinheiro, ele não chegou na hora do plantio, em que se precisava. Houve sim uma seleção maior por crédito e isso, possivelmente, pode diminuir parte da área plantada de grãos, mesmo com preços melhores”, previu.
Décio Zylbersztajn espera que a “economia, na melhor das hipóteses, comece o cenário de ajustes” em 2016, situação que não considera de todo favorável. “Não vamos passar incólumes por isso, porque o nível de investimento continua muito pequeno e compromete nossa produtividade nos próximos períodos”, argumentou.
Neste ambiente, o professor da USP ponderou que produtores menos tecnificados se provam mais resilientes, já que têm custos financeiros menores.
Estadão Conteúdo