Campo Grande (MS) – O avanço da adoção de sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) no país será ressaltado pela comitiva brasileira que participa da Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, a COP 23. O evento teve início na última segunda-feira e irá até o dia 17 em Bonn, na Alemanha.
A ILPF é uma das tecnologias que fazem parte do Plano de Agricultura de Baixo Carbono (Plano ABC). De acordo com pesquisa encomendada pela Rede de Fomento ILPF e realizada pelo Kleffmann Group na safra 2015/2016, o Brasil conta hoje com 11.468.124 hectares com sistemas integrados de produção agropecuária (clique aqui para fazer o download do arquivo).
O número, em crescimento, é dez vezes maior do que a área ocupada pela tecnologia em 2005. Desse total, Mato Grosso do Sul lidera o ranking nacional em áreas com ILPF, com 2.085.518 hectares, seguido pelo Mato Grosso, com 1.501.016 hectares, Rio Grande do Sul (1.457.900 ha); Minas Gerais (1.046.878 ha) e Goiás e DF (943.934 ha).
“A adoção da ILPF é hoje predominante em Mato Grosso do Sul e estratégica para a política de desenvolvimento sustentável do governo do Estado, que é promovida no âmbito da Semagro e órgãos vinculados. Nossa estratégia é a disseminação desse modelo de integração, seja ele lavoura e pecuária, pecuária e floresta, lavoura e floresta. A apresentação da ILPF na COP 23, como tecnologia de baixo carbono só reforça que estamos no caminho correto”, comentou o secretário de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar, Jaime Verruck.
Segundo a pesquisa encomendada da Rede de Fomento ILPF, o Brasil já cumpriu há três anos a meta estipulada pelo Plano ABC em 2009, que era de aumentar em 4 milhões de hectares a área com ILPF até 2020. Com o Acordo de Paris sobre Mudança do Clima, ratificado pelo governo brasileiro em 2016, entretanto, mais 5 milhões de hectares foram acrescentados à meta, com previsão de ser atingida até 2030.
Tecnologia sustentável
A ILPF é uma estratégia de produção que integra diferentes sistemas produtivos, agrícolas, pecuários e florestais dentro de uma mesma área. Podendo ocorrer com cultivo consorciado, rotacionado ou em sucessão, de forma que haja interação benéfica entre os componentes. Pode ocorrer com os três componentes (ILPF), ou com as combinações de dois a dois (ILP, ILF, IPF).
Entre as vantagens desse sistema produtivo estão a intensificação sustentável do uso da terra, a diversificação da produção, a geração de emprego e renda, a conservação do solo, o melhor uso dos recursos naturais e dos insumos, a redução da pressão pela abertura de novas áreas, o bem estar animal e também a mitigação das emissões de gases causadores do efeito estufa.
Como a ILPF se baseia em preceitos conservacionistas, como o plantio direto na palha, a rotação de culturas e a recuperação de pastagens, ela contribui para a maior eficiência produtiva e para aumentar a matéria orgânica no solo.
“Tanto a pastagem quanto a floresta acumulam uma grande quantidade de carbono no solo, que é retirada da atmosfera. De alguma maneira que ainda não conhecemos totalmente, os microrganismos do solo passam a consumir um volume maior de metano, principalmente nas áreas de eucalipto, seja em monocultura ou ILPF. Então a gente tem também o sequestro de metano. Com a melhor qualidade da forragem, o animal tem melhor digestibilidade e passa a emitir menos metano. Além disso, a redução do tempo de vida do animal faz com que ele emita menos durante a vida dele”, enumera o pesquisador da Embrapa Solos e presidente do Conselho Gestor da Rede ILPF, Renato Rodrigues.
Outra contribuição da ILPF, explica o pesquisador, é que como o sistema resulta em aumento da produtividade dos três componentes, há uma redução da intensidade das emissões, taxa calculada pela relação entre a quantidade de quilos de carbono equivalente emitido e o volume em quilos de produto gerado.
Mitigação das emissões de gases
Estimativa feita pela Plataforma ABC, estrutura multi-institucional responsável pelo levantamento de dados sobre as emissões de gases de efeito estufa no setor agropecuário, indicam que entre 2010 e 2015 foram estocados 21,8 milhões de Mg de CO2eq. Isso confirma que o objetivo estabelecido pelo Plano ABC para 2020, de ampliar em quatro milhões de hectares a adoção de sistemas ILPF, correspondendo ao sequestro de 18-22 milhões de Mg de CO2eq, já teria sido alcançado.
O pesquisador Renato Rodrigues explica que o Plano ABC trabalha com o potencial de mitigação de 5 Mg de CO2eq por hectare de sistemas ILPF. Entretanto, resultados preliminares de pesquisas indicam que esse valor pode ser ainda superior, chegando a 7 Mg de CO2eq. Caso os dados se confirmem, a contribuição da ILPF será ainda maior para a redução das emissões de gases causadores do efeito estufa.
Financiamento internacional
Durante a segunda semana da COP 23, uma equipe da Rede ILPF, parceria público-privada criada há cinco anos com o objetivo de fomentar a adoção dos sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta no país, estará junto ao Ministério do Meio Ambiente para divulgar a tecnologia brasileira e para buscar recursos internacionais para custear novas pesquisas sobre o tema e ações de transferência de tecnologia.
A agenda inclui reuniões com o Departamento de Meio Ambiente, Alimentação e Assuntos Rurais do Reino Unido (Defra), com a Embaixada do Brasil em Londres, com o Ministério do Meio Ambiente brasileiro e o Ministério Alemão da Energia e Mudança do Clima.
De acordo com Renato Rodrigues, o objetivo é apresentar um projeto chamado “Programa de Segurança Alimentar e Nutricional, Valorização do Campo e Tecnificação da Agricultura Tropical: ILPF, a alternativa para a agricultura do amanhã”.
A proposta, elaborada pela Rede ILPF, prevê ações para os próximos dez anos e busca captar 1 bilhão de dólares junto a instituições internacionais.
O programa é composto por oito eixos que englobam desde ações para certificação de propriedades que adotem os sistemas ILPF até ações que fomentem a assistência técnica e incentivem a adoção da tecnologia. Também entram no programa ações de comunicação e de valorização da agricultura brasileira e a transferência de tecnologias de ILPF para a África, América Latina e Caribe.
“A nossa ideia é implantar um milhão de hectares de ILPF dentro de um programa de certificação reconhecido internacionalmente até 2025. Com uma meta inicial de 300 mil ha até 2020, condicionada à captação de recursos internacionais. O que vamos buscar agora é fazer esses acordos internacionais por meio de green bonds (títulos verdes) para conseguir o orçamento total do programa”, afirma o pesquisador e presidente da Rede ILPF.
Realidade aumentada
Para facilitar o entendimento sobre o que são os sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), suas diferentes configurações e os benefícios que trazem, a Rede ILPF desenvolveu um aplicativo que representa uma maquete do sistema produtivo em realidade aumentada.
A ferramenta, em versões inglês e português, será apresentada pela primeira vez durante a COP 23 e estará disponível para download nas lojas de aplicativo até o fim do ano.
Por meio dela, o usuário consegue ver todas as etapas de um sistema de integração, ver o que acontece no perfil do solo, a ciclagem de nutrientes, a dinâmica de água e de carbono, o aprofundamento de raízes, entre outras características do sistema.
Rede ILPF
A Rede ILPF é uma parceria público-privada criada em 2012 para fomentar a adoção dos sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta no país. Fazem parte atualmente da Rede além da Embrapa, a Cocamar, Dow Agrosciences, John Deere, Parker e Syngenta.
Nesse período, a Rede apoiou a consolidação de 107 Unidades de Referência Tecnológica em todo o país e fomentou capacitações de agentes de assistência técnica e extensão rural, a realização de dias de campo, visitas técnicas, eventos técnicos-científicos, entre outras ações.
Atualmente a Rede ILPF está mudando sua estrutura jurídica para se transformar em uma associação. Com isso, novas instituições poderão aderir à iniciativa, ampliando as ações de transferência de tecnologia, comunicação e também de pesquisa.